domingo, 31 de outubro de 2010

CHEZ LANE NAVES


Rita Barbugiani, Regina, em almoço na casa da Lane, 29.10.2010.
O tempo anda passando tão rápido que quando percebemos a semana já se foi, os meses, os anos se sucedendo numa velocidade incrível!

Hoje amanheceu chuvoso depois de um calor tremendo dias a fio! Na chácara tudo se apresenta mais agradável com este cheirinho de chuva e os pássaros parecem mais felizes ainda!

Leandro, Monique, Regina, Sônia, Celina e Marco, 28.10.2010.
Tivemos uma semana movimentada. Aleixo diz que eu arranjo programas diários e estamos sempre ocupados. Almoçamos fora quase todos os dias, inclusive atendendo convites de familiares e amigos! Amizade é algo salutar em nossas vidas, faz bem à energia de nossa alma!

Hoje é dia de eleição e votaremos neste segundo turno para presidente e governador de Goiás. Desejo apenas que seja eleito o que for melhor para a região e para o país!

Apolo em 30.10.2010.
Apolo durante o banho.













Ontem fui molhar as plantas com a mangueira no chuvisco, nosso papagaio Apolo percebeu e quis tomar banho! Ele veio para o vaso que eu estava aguando e tive que desviar a mangueira para que ele não o estragasse com as suas acrobacias. Apolo fez tantas poses para se lavar todo que Aleixo não resistiu e foi buscar a câmara para registrar as cenas!

Acrobacias do Apolo durante banho.
Apolo antes do banho.











Depois de exercer o magistério com dedicação e entusiasmo por décadas, agora me sinto feliz apenas com as pequenas coisas do dia-a-dia. Meu amigo Giuseppe escreveu em seu blog – Confidências ao espelho - sobre a fase da vida denominada melhor idade e concordo com ele.

“Continuo vivo! Não sei o que a próxima década reserva para mim, mas estou entrando nela vivo e com vontade de viver. Não apenas como uma "sobrevida", mas como uma fase em que devo realizar. E me realizar”.







quinta-feira, 28 de outubro de 2010

MAIS MEMÓRIAS DA MINHA INFÂNCIA

Regina Lúcia, 2010
Adorávamos brincar no jardim e no quintal de casa. Claro que preferiríamos fazê-lo na rua, a exemplo de muitas outras crianças da vizinhança, mas minha mãe não o permitia. Como éramos muitos irmãos brincávamos correndo pelo grande jardim, sobretudo. Às vezes, algumas crianças de fora participavam de nossas brincadeiras. Era o caso dos filhos de amigos de Brasília, cujos pais vinham fazer consultas no centro e deixavam os filhos em nossa casa. Acontecia também com os filhos de Dona Santuca que alugaram a casa vizinha da rua cinco por uns tempos.

Clélia, Sônia, Júnior, Regina e Marco, 1958.
Também me lembro da alegria quando minha mãe arrumava seus cinco primeiros filhos e nos levava para um passeio até o coreto da Praça Cívica. Normalmente, ela carregava uma sacola com laranjas e bananas. Passávamos no mercado central que funcionava onde hoje é o Pathernon Center e ela comprava seis pastéis. Como era bom aquele cheirinho de fritura gulosa no saco de papel bege, molhado de gordura, e a expectativa da pequena aventura que empreendíamos! Ela dava as mãos para os dois menores, Sônia e Júnior, e os outros três se posicionavam de cada lado, também de mãos dadas com os irmãos. Eram uns sete ou oito quarteirões, de nossa casa até o local. Lá ela se sentava em um banco de granito e nós brincávamos na grama ao redor.

 Marco Antônio, à direita, em 1947, com coleguinhas de sua época.
Nessas ocasiões, mamãe repartia as bananas, descascava as laranjas para cada um, distribuía os pastéis e, às vezes, ainda comprava garapa. Sentíamos muito felizes com aquela liberdade vigiada! A gente não podia sair de casa a não ser para a escola e os passeios nos finais de semana em família. Papai construiu a nossa casa em um lote e o outro era devidamente cercado e plantado para nossas brincadeiras. Meu primo Luiz Roberto estava sempre lá em casa brincando com meu irmão, mas eram raras as oportunidades de encontrarmos outras crianças. Isso acontecia nos aniversários familiares, quando encontrávamos os primos, filhos de Tia Hilda e Tia Agda, irmãs de criação de mamãe. Papai tinha muitos irmãos, mas casou-se por último e demorou a ter filhos, portanto, os primos paternos eram muito mais velhos, exceto o Luiz Roberto, filho caçula de tio Venerando, que desapareceu em acidente de avião, aos vinte anos, em outubro de 1963.

Clélia Maria, em 1956.
Uma vez, Clélia e eu resolvemos brincar com uma mala. Cada uma entrava na mala e era trancada. Ela entrou e eu não conseguia abrir e passei o maior sufoco pensando que havia matado a minha irmã que acabou saindo viva da brincadeira, depois de eu ter pedido auxílio. Quando ela era pequena e perguntavam o seu nome, ela respondia: - Kela Balila!

Lembro-me, ainda, do dia do enterro de minha irmãzinha Elisabete. Ela seria a quarta filha e chegou no dia dois de maio de 1952, um ano antes da Sônia, mas durou apenas três dias. Meus pais a descreveram como uma menina bonita, grande e saudável, mas ela vomitou à noite no berçário e morreu asfixiada. Meu pai fez um escândalo no hospital, denunciando o descaso médico. Ele havia ficado decepcionado por não ser mais um herdeiro homem que ele esperava e deve ter sentido remorso! Nesse dia, levaram a minha prima - Letícia Araújo Pereira - que era pouco mais velha do que eu para brincar comigo. Ela gostava de plantas e passamos o tempo todo fazendo mudas no jardim!

As gêmeas aos seis anos. Nasceram em 1961.
Em 1957, meu irmão Marco foi para o colégio interno em Belo Horizonte. Lembro-me de que fomos acompanhá-los até o aeroporto que funcionava, então, onde hoje é a Praça do Avião, no Setor Aeroporto. Minha mãe chorava muito, era muito apegada aos filhos. Ele ficou interno cinco anos e no primeiro ano nem veio para as férias de julho. Meu pai achava que isto faria bem para a sua educação masculina! Nossa prima, filha do tio Venerando e casada com o aviador Gilberto Araújo - a Éclair -, morava na cidade e poderia dar-lhe assistência, se necessário!

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

AINDA LEMBRANÇAS DA MINHA INFÂNCIA


“O essencial faz a vida valer à pena. Basta o essencial! Caminhar perto de coisas e pessoas de verdade, desfrutar desse amor absolutamente sem fraudes, nunca será perda de tempo”. Rubem Alves

Regina em 2010.
Meus pais adoravam comemorar os nossos aniversários e sempre vou lembrar-me dos salgadinhos, doces, enfeites, preparados com capricho e muito trabalho carinhoso para as celebrações. A expectativa da festa e o seu acontecimento eram pura alegria. Convivemos bastante com nossos primos maternos, os cinco filhos da Tia Hilda e os dois primeiros da Tia Agda. Mais tarde repeti a experiência festejando os aniversários de meus filhos e compartilhando as festinhas dos sobrinhos e netos.

Como havia pouca diversão naquele período em Goiânia, qualquer aniversário, casamento ou batizado era um acontecimento muito esperado. Marco, Clélia e eu ainda pegamos a festa de carnaval da ANAG. Minha mãe dificilmente podia ir porque ela estava freqüentemente grávida ou com filho pequeno e papai costumava comprar confete, serpentina e lança-perfume e nos levar fantasiados às matinês carnavalescas.

Em 1950, ele comprou um carro importado, um NASH vermelho conversível e levava os dois filhos mais velhos pela cidade. Engraçado que nunca soubemos que o lança-perfume de metal vindo da Argentina servisse para outra coisa a não ser esguichar nos olhos dos outros... Pode?!

Regina em 1950.
Papai tinha muita superstição em relação ao mês de agosto e foi no dia primeiro de agosto que ele saiu com o meu primo Carlos, filho do Tio Venerando e bateram o Nash. O carro precisou ser totalmente reformado, eles quebraram costelas e tiveram alguns ferimentos sem grande importância. Eu tinha apenas dois anos e meio, mas ainda me lembro de eles entrarem pela garagem, na rua cinco, machucados e contando os detalhes da capotagem que teria acontecido na estrada sem asfalto de Bela Vista, àquela época.

Tio Venerando costumava nos visitar diariamente e estava sempre alegre, idealista, então. Sempre me rodava e tentava me ensinar a dançar tango. Com o tempo afastou-se do tudo, infeliz com a morte precoce de quase todos os filhos. Depois da morte de papai ele nunca mais foi à nossa casa e um dia me explicou que não suportaria as lembranças do local. Seu filho Hírcio gostava de briga de galos e vivia envolvido com brigas. Andava de lambreta e nós, as crianças, o olhávamos com admiração censurada. Nos finais de semana papai e mamãe nos levavam de carro até à Praça Cívica. Todos nós adorávamos brincar de pique, comer pipoca e algodão doce.

Clélia, Sônia, Zezinho, Regina e Marco, 1957.
Nosso passeio dominical incluía a visita ao Horto para ver os bichos, antes de visitarmos a vovó. Mas, quando vovó Maria Magdalena ainda morava à Avenida Anhanguera, ela costumava passar para me levar à missa na Igreja Coração de Maria onde fui batizada. Aconteceu de ela levar a mim e a Clélia num domingo cedinho e às nove horas o seu filho -Tio Augusto- passar com Tia Raquel e nos levar ao culto ecumênico da Igreja Presbiteriana. Esse era muito mais divertido que a missa em latim! Sempre me lembro do cheiro da igreja: roupas domingueiras, flores, velas, mofo. Nunca gostei de multidão e as missas eram bem cheias naquele tempo.

Marco e Regina, em seu batizado.
Durante a semana eu costumava acompanhar o Marco a suas aulas particulares. A gente passava pelos lotes vazios do centro onde morávamos. Uma vez, o Marco foi agredido por moleques da rua e eu o defendi corajosamente jogando carrapichos nos meninos que tentavam bater-lhe, mas esses me acharam tão insignificante que nem revidaram.

Antes de aprender a ler, minha mãe me colocou na aula de piano com Dona Mafalda, por meio do método colorido. Depois estudei com a Nizinha, minha prima, também filha do tio Venerando. Lembro-me de que no dia da queda do Getúlio Vargas fiquei muito feliz, porque não houve aula no Colégio Santo Agostinho, nem de piano!

Lembrança de aniversário do Marco, 1949.
Lembrança de aniversário da Regina, 1957.











Mais tarde tive aulas de piano com a Dª Diana Spencière e, por último, com a sua irmã, Dª Hebe, tia da Annunziata. Quando entrei para o Conservatório de Música, lembro-me de que fui examinada pela Belkis Spenciére que era muito amiga de minha mãe. Portanto, não foi por falta de bons professores, e sim de talento musical que me tornei apenas apreciadora da boa música.

Divina de Paula era minha colega de classe no Externato São José desde os nove anos de idade, além de  vizinha. Joaninha Macedo tornou-se minha amiga no ano de 57, quando freqüentamos o Colégio Maria Auxiliadora. Helga Brockes foi minha professora de inglês já na adolescência e Bené passou a fazer parte de minha vida, em 62. O reencontro de afins propicia a amizade reconstruída ao longo dos anos  e é para sempre, transcendendo até mesmo as mudanças de plano espiritual...

domingo, 24 de outubro de 2010

SONHOS


"O sonho é a estrada real que conduz ao inconsciente.” Sigmund Freud

Regina e Bettina, na Shamballa, 2010.
O sonho é uma manifestação criativa da psique, mente inconsciente e consciente, e transcende os meros cinco sentidos. Portanto, os sonhos podem, de forma simbólica e numa linguagem própria, revelar questões de nossa personalidade que precisam ser trabalhadas. Além de apresentarem soluções para problemas do cotidiano e regular suas emoções internas, os sonhos se constituem de uma forma especial de consciência.

Carl Jung não reduz os sonhos à satisfação de desejos reprimidos no inconsciente pessoal, como o fez Freud. Ele os toma como mensageiros de complexos. Segundo ele, anexo a nossa consciência imediata existe um segundo sistema psíquico, de natureza coletiva, universal e impessoal, que se revela idêntico em todos os indivíduos. Povoando esse inconsciente coletivo há os arquétipos que são símbolos, impressos na psique desde o começo dos tempos e, a partir de então transmitidos à humanidade inteira. A mãe, o pai, a criança, a anima, o animus, o herói, a sombra, com seus temas associados, são exemplos de tais arquétipos, representados mundialmente em mitos, nas histórias infantis e nos sonhos. As mensagens arquetípicas dos sonhos conferem uma forma definida a determinado conteúdo psíquico do inconsciente e quase sempre assumem imagens simbólicas.

A psique coletiva, que é uma seleção de arquétipos de um povo em determinada época de sua história, molda a psique individual, isto é, a personalidade de cada um de nós. Todavia, no fundo, a coletiva é a exteriorização das individuais. Desse modo, a psique coletiva e a individual existem numa relação dialética.

"Dentro de cada um de nós há outro eu que não conhecemos. Ele fala conosco por meio dos sonhos.” Carl Jung

Orquídeas e azaleas da Regina.
Desde sempre, os homens procuram entender as mensagens ou os significados desses fenômenos intrigantes e misteriosos que são os sonhos. O que varia é a importância que lhes é atribuída e a compreensão que se tem deles. Nossa vida e nossa história se constroem nos dias em que estamos acordados e nas noites em que dormimos e sonhamos. A psique diurna, consciente, e a psique noturna, inconsciente, apesar de diferentes, se completam para o todo que somos. Por meio dos sonhos estabelecemos uma comunicação com esse lado noturno, em geral desconhecido, mas não menos vivo e atuante.

Os sonhos estão relacionados tanto à nossa saúde psíquica quanto física. Corpo e psique estão interligados ou, como diz Jung: "a psique e a matéria são aspectos diferentes de um único todo". Como expressão simbólica do processo vital, o sonho tem implicações profundas e elevadas, para o físico e para o espiritual, para o corpo e para a psique. O sonho pode ser um aliado valioso para a compreensão dessas interligações, ou seja, eles podem constituir uma chave preciosa para nosso autoconhecimento e bem-estar.

Lembro-me de dois sonhos que ficaram registrados para sempre. O espaço de um deles foi a Espanha. Eu sabia que morava lá e que a minha amiga Helen criticava a minha falta de direção. Eu andava por ruelas estreitas duma cidade antiga e me dirigia ao túmulo de uma freira que eu identificava. No sonho eu sabia que a sepultura era minha e enquanto esperava a minha amiga lá eu me vangloriava de conseguir chegar tão rápido àquele local, mesmo com as minhas limitações espaciais.

O outro também está relacionado com a minha amiga Helen. Talvez porque naquela ocasião a gente convivesse bastante. Eu havia tido um sonho e ela, outro diferente, que compartilhamos. Então, viajamos para o Peru. Era o ano de 1997. Quando chegamos a um local ela viu as aves de seu sonho. Logo, eu encontrei também o local onde antes eles embalsamavam pessoas e animais. Uma mesa de pedra embaixo de uma laje, ou seja, igualzinho ao meu sonho compartilhado bem antes. No texto onírico eu era auxiliada por aquele que agora é meu neto Frederico.

Bettina e Regina, na Shamballa, 2010.
Há poucos dias atrás, tive dois sonhos interligados numa madrugada. Primeiramente, sonhei que pegava o meu passaporte que veio pelo correio com o visto de entrada para os EUA e via nele algo que não tinha prestado atenção ao recebê-lo. Eram duas anotações. Uma delas apresentava a data nítida, 8/4... O ano eu pensava que era o atual, mas não conseguia conferir, porque não ficava claro, e imaginava se seria 2011... Era como se fosse premonição de uma morte, talvez minha, talvez do Aleixo, ou outra pessoa, eu não sabia bem de quem... Então, eu lembrava o que havia visto durante o dia, a questão de o Plutão estar ingressando em capricórnio...

A outra nota, dizia a respeito de alguém que estaria me esperando, talvez para me entregar o passaporte e colocava uma nota ali que eu lia. Esta nota era cheia de emoção da alegria e boa expectativa com que essa pessoa me aguardava...
O interessante é que parte da nota era viva, ou seja, estava escrita, mas ao lê-la, eu via parte de meus olhos, acesos, iluminando o que estava escrito. Esta nota dizia respeito a alguém já me conhecia e que estaria me esperando quando eu viesse buscar o passaporte.

No sonho interligado eu ia com minha irmã Sonia buscar alguma coisa em algum lugar. De repente era uma restaurante e eu sabia que este restaurante era perto de meu antigo apartamento no setor oeste que vendi para comprar o outro no Rio. Pois eu ficava sabendo que o tal restaurante era ótimo e eu nunca soube dele quando morara próximo. A pessoa que nos atendia explicava tudo e depois nos levava a algum lugar. Só que ela ia de carro e nós duas ao lado, mas a pé...

Aniversário da Áurea Sgarbi - Shopping do Pão, no Alpha Mall.





Regina Lúcia, 2010.
Dia 21 de outubro foi aniversário da nossa colega da PUC - Áurea Sgarbi. Assim, combinamos de nos encontrar hoje, pela manhã, no Shopping do Pão, para comemorarmos com um delicioso brunch.

O Shopping do Pão é dirigido por duas sobrinhas – Priscila Araújo e Isadora Caixeta. Aos domingos eles servem o café da manhã completo e de alta qualidade. O preço é promocional e você pode comer o que quiser, incluindo pães, biscoitos, bolos, salada de frutas, tapioca, omelete, sanduíches, sucos, café, leite, chás. O espaço é deveras agradável e quem mora nas redondezas já se acostumou a fazer o seu desjejum naquele local. 
Lane, Regina, Rosane, Rita e Áurea, 24.10.2010.
 Lane pediu à Rita para comprar um presentinho em nome de nós três que lhe entregamos durante o encontro. Rita tem extremo bom gosto e escolheu um lindo par de brincos de turquesa que Áurea agradeceu emocionada. Rosane me ajudou com os convites e também brindou a aniversariante com presente.

Aleixo ocupou-se com as fotos e entreteve as convidadas com relatos de nossa recente viagem ao UK. Tanto Rosane como Áurea são professoras de inglês e já visitaram o Reino Unido antes. Lane também já esteve na Europa e contou detalhes de sua estada na Itália.

Nós trouxemos gravuras de Londres com as quais presenteamos as convidadas, de acordo com a seleção de cada uma. Todas se propuseram colocá-las em molduras para decorar a sua casa com um pouco do espírito europeu.

É muito bom parar as atividades do dia-a-dia para trocarmos figurinhas com afins e sempre que posso encontro um bom motivo para justificar essa troca energética tão positiva!

Parabéns, Áurea, pelo cumprimento de mais um ciclo com sucesso. E que, nesta nova etapa que agora está iniciando, você possa concretizar todos os seus sonhos!

 

sábado, 23 de outubro de 2010

A DESPEDIDA DE OIMBÔ



“Não fique triste nas despedidas, pois encontrar-se de novo, depois de momentos ou de vidas, é certo para aqueles que são afins” Richard Bach

Oimbô no jardim de Shamballa com Regina e Bettina, 2008.
Acredito na frase do Bach, mas não sei se isso vale também para os animais, apesar de já ter visto este tipo de reencontro expresso em livros de cunho espiritualista ou em filmes... Oimbô foi embora ontem e vou agradecer muito se puder reencontrá-lo um dia!
Nossa convivência foi de mais de cinco anos. Logo que compramos a chácara, eu quis um cachorro e tinha que ser Labrador. Vi o seu anúncio no jornal, liguei, troquei E-mails com a proprietária e fomos buscá-lo no local e na data combinados. Ele nasceu em três de maio de 2005, em Anápolis. No carro, ele veio no meu colo e tinha dois meses e meio. Gostei dele instantaneamente e fui correspondida!

Ele era um cachorro especial, muito diferente do Marley do filme. Inteligente, bonito, calado, observador... Olhava as brincadeiras das cachorras com certo ar de superioridade. Parecia entender tudo o que a gente queria que ele fizesse.

Ele se machucou quando a gente estava viajando e apesar do cuidado que ele recebeu nas últimas semanas, ele não superou.

Quando eu era bem pequena, também tivemos um cachorro policial - TUPI  - que um dia partiu. Eu me lembro de ter sentido muito a sua falta. Era um policial maior do que eu, na época, que me derrubava e com quem eu rolava na grama.

Prefiro cachorros grandes, não gosto de animais em minha cama ou sofás. Oimbô sempre respeitou os limites, mas vinha deitar-se próximo da parede do quarto onde eu estava. Ia receber-nos a cada vez que voltávamos para casa...

Oimbô quer dizer homem branco.
Aleixo cuidava muito mais dele do que eu, mas ele me escolheu como sua dona e o demonstrava sempre! Cada vez que eu adoecia, ele ficava próximo e me olhava com aquele olhar carinhoso do Mister Magoo!

Antes de ele partir, quando retornei da cidade ontem, ainda lhe dei um pedaço de mamão, pão francês e sorvete! Ele gostava de maçã e de cenoura também. Não comia qualquer ração, nem tomava água suja. Olhava com nojo quando as cachorras entravam no bebedouro e sujavam a água. Ia lá longe beber água limpa! Aleixo criou um sistema de eles terem sempre água corrente pingando em vasilha que elas não conseguem sujar.

Ele fugiu umas duas ou três vezes, mas retornava e cedinho nos esperava junto ao portão. Na última vez, mais de um ano atrás, ficou desaparecido uns três dias, porque o prenderam.

Frederico e eu fizemos o ritual de emergência ao arcanjo Uriel para que ele voltasse. Lembro-me de que o Fred, sem muita convicção, me ajudou a rezar por seu retorno. Mas, quando ele foi encontrado, ele passou a compartilhar a minha fé no arcanjo.

Desta vez senti que não devia repetir o pedido e aguardei o desfecho.

A partida do Oimbô ainda está doendo muito, mas sempre serei grata por ter tido o privilégio de sua convivência!

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

MULHERES DA FAMÍLIA ARAÚJO

 Vovó Maria Magdalena e Tia Maria Hermínia

Regina, 2010.

Lembro-me de minha avó morando numa casa nos fundos da antiga Loja Buri, na Avenida Anhanguera. O prédio era de meu pai e meus avós moravam lá com a minha tia e madrinha Hermínia. Esta não se casou e sempre tomou conta dos pais com extrema dedicação amorosa.


Maria Hermínia de Araújo, 1930.
Tia Hermínia foi uma das melhores pessoas que conheci. Trabalhou nas Casas Pernambucanas e, por último, na Prefeitura de Goiânia, até se aposentar. Criou uma menina órfã de mãe – Erotides, que se graduou em Letras, ficou viúva meses depois do casamento e cujo único filho, hoje, está casado e graduado em direito. Tia Hermínia doou a sua casa em vida para a Erotides que cuidou dela até sua morte.

Minha avó fazia renda nos bilros e eu a admirava muito. Sentia o seu carinho quando eu chegava lá, ela elogiava a minha aparência e me presenteava com rolos de rendas feitas por ela mesma. Eu adorava as cocadas que ela fazia. Tão branquinhas! Um dia, ao chegar, ela me levou até o quarto e tirou de cima do armário um prato esmaltado cheio de cocadas que havia escondido para me oferecer. Eu logo peguei uma com gulodice, mas avisei que elas me davam “tadanêla”. Todos riram da minha consciência na linguagem infantil!

Uma vez fomos dormir em sua casa e achei lindo quando ela tirou o pente do coque e soltou o cabelo à noite, penteando-o antes de dormir... Ele era tão comprido que ela podia sentar-se sobre as pontas do seu liso cabelo preto que nunca precisou ser tingido!

Maria Magdalena Araújo, 1876-1967.
Depois eles se mudaram para um bairro distante naquela época – Setor Coimbra. Não havia asfalto até lá, apenas poucas casas, além de um conjunto popular ao longe. Aos domingos costumávamos visitar a minha avó. Papai fazia questão disso e para as crianças era uma verdadeira aventura. A casa tinha um pequeno muro na frente e cerca de arame farpado nas laterais. Adorávamos aquele descampado e saíamos brincando pelos lotes vagos da vizinhança. Mais de uma vez um de nós voltava cortado pelo arame da cerca.

Meu avô gostava de viajar e quando não pôde mais fazê-lo a cavalo, ia a pé mesmo com a sua mala com couro para negociar.
Vovó esteve sempre lúcida, mas Vovô João caducava nos últimos anos de vida. Era do tempo em que a palavra do homem servia como documento e assim perdeu todas as suas propriedades por não tê-las escriturado. Os filhos tentaram alertá-lo, mas a sua falta de humildade e o seu patriarcalismo nunca permitiram que ele ouvisse os conselhos.


 Tia Maria Araujo Borges,
casada com primeiro Prefeito de Goiânia.
1904-1992.
Ontem, dia 21.10, fez 43 anos do passamento de minha avó - mulher admirável que criou 14 filhos. Nasceu no nordeste, onde meu avô foi dono de muitas fazendas. Depois vieram para Goiás. Tanto ela como meu avô eram leitores assíduos, coisa rara naquela época. Ela cuidava das plantas, das tarefas domésticas, era exímia cozinheira, adorava o cinema e, nos últimos anos de vida, a televisão recém chegada a Goiânia. Não ia a médicos e ninguém nunca a viu doente.



Vovô João Antônio Araujo, 1878-1967.

Avó Maria adoeceu na véspera de sua mudança de plano que aconteceu no ambiente doméstico. No mesmo ano partiram meu avô João Antônio, meu pai José Araújo e minha avó Madalena.
Que eles possam galgar planos espirituais cada vez mais elevados e, na medida do possível, zelar por sua descendência!

Ontem, Aleixo e eu passamos grande parte do dia coletando documentos para a transferência de titularidade e conseqüente reforma do jazigo da família Araújo, no cemitério Santana.





quinta-feira, 21 de outubro de 2010

MEMÓRIAS DA MINHA INFÂNCIA

Regina no Santuário do Evandro, em Pirinópolis, 2002.
Mamãe nos vestia como bonecas! Orgulhava- se de ver seus filhos bem arrumados de acordo com a época! As meninas tinham anáguas engomadas por baixo da outra de renda. Os cabelos bem penteados, amarrados com fitas! Várias vezes fui com meu pai, na Avenida Anhanguera, comprar fitas de tafetá ou de organdi para o cabelo! Os vestidos eram bordados, com babados, nervuras, casinha de abelha, bordado ajour, sempre muito bem passados, com sapatos e meias combinando! Ela gostava de repetir e creio que acreditava nisso – suas filhas eram as meninas mais bem vestidas de Goiânia! Lembro-me de que tive uma grande festa de aniversário no meu nono ano e meu vestido era azul e tinha cento e vinte pequenos botões o enfeitando!

Marco Antônio, 1949.
Regina Lúcia, 1954.












O problema era nos aprontar para sairmos! Para evitar problemas, ela cuidava dos maiores primeiro e nos colocava de castigo, sentados sobre o móvel da sala, como mauricinhos e patricinhas, muito bem adestrados! Nunca esqueci o incômodo da goma dura das anáguas na minha pele, mas ninguém tinha coragem de reclamar! Ao sair para algum aniversário, muitas vezes éramos aconselhados a agradecer tudo com educação e não aceitar nada...

Clélia Maria, 1954.
Sônia Cristina, 1958.












Quando ainda pequena, meu irmão Marco me protegia e me levava para passear no bosque da Araguaia onde hoje fica o Mutirama. Ele sempre foi criativo e construía muito de seus próprios brinquedos. Esse passeio era feito na carrocinha de madeira que ele mesmo fazia. Mais tarde, ele fez um curso de rádio por correspondência e montou vários aparelhos. Com ele aprendi também a fazer raias. Buscávamos taquara, comprávamos o papel de seda, a linha, ele fazia tudo com perfeição. Interessou-se por aeromodelismo e criou um aviãozinho especial que conseguiu fazer voar de verdade. Pena que ele não calculou direito... O objeto voador acabou atingindo-o na mão, que mereceu cuidados especiais.
José Araújo Júnior, 1959.

Maria Celina e Maria Luiza, 1965.












Eu não tinha o gênio fácil! Apanhava muito de minha mãe! Quando ela estava nervosa, descontava no primeiro que passasse perto... Apanhei com sapatos de salto, com o espanador, entre outros! Dificilmente eu chorava e isso a enraivecia e me batia um pouco mais! Nestas ocasiões eu olhava para ela com certo ar de superioridade, julgando-a parcial, ela percebia e me chamava de insensível! Clélia chorava muito e fazia xixi e mamãe batia apenas em mim! Um dia, bem mais tarde, quando a questionei sobre o fato, ela me disse que era justo porque eu era a mentora das traquinagens... Imaginem se vou concordar!

Eu me dava bem com Clélia que chegou depois de mim e sempre compartilhamos o quarto e as brincadeiras. A irmã seguinte era a Sônia que chegou muito birrenta. Chorava, dava birra o tempo todo e nos irritava bastante. Depois, descobrimos que era para chamar a atenção e quando ela deitava no chão esperneando e gritando, nós passávamos por perto, ela aumentava os gritos e nós dizíamos que nem a tínhamos visto ali, pensávamos que ela fosse uma barata, e, então, ela calava a boca. Ela vivia nos vigiando para contar a mamãe as nossas artes! Quando Sônia foi para a escola a primeira vez, a freira chamou minha mãe e pediu que a matriculasse no ano seguinte o que aconteceu. Lembro de minha mãe contando o que a religiosa havia dito a Soninha que chorava o tempo todo: - “Menina, tranque esta boca e jogue a chave no inferno”! Quando nos casamos ficamos mais unidas, pois nossos filhos cresceram juntos!

Minha mãe tinha algumas crenças singulares! Alguém disse a ela que para evitar tétano era preciso colocar uma cabeça de cebola no prego que havia machucado a criança. Meu irmão Marco vivia pisando em pregos e lembro-me de minha mãe procurando pelos pregos ofensores em nosso quintal com a cebola na mão prontinha para prevenir o tétano em meu irmão!

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

MAIS MEMÓRIAS DA INFÂNCIA


Regina em Saquarema, RJ, 2002.
Aprendi a brincar inicialmente com meu irmão e primo que eram respectivamente quatro e cinco anos mais velhos que eu, além de meninos. Fiquei destemida! Lembro-me de um dia que corria sobre o muro que separava nossa casa do lote vago, também de nossa propriedade, passando pelo telhado da dependência dos empregados, subindo na grande mangueira do quintal. Aliás, aos cinco ou seis anos eu fiquei engessada durante três meses, por ter quebrado a clavícula ao cair da parreira, depois de excursionar por muros, telhados e árvores.

Com o passar do tempo, fui ficando medrosa e passei a vez para a Clélia que também caiu da mangueira. Mamãe não podia saber ou ela seria castigada, então, ela ficava usando mangas compridas para esconder o machucado dos braços e eu a ameaçava de contar o acidente à mamãe, caso ela não compactuasse com minhas artes.

Regina e Marco, 1951.
Outra vez caí de cima do guarda-roupa e quebrei artelhos, além de rasgá-los em um parafuso do puxador da gaveta. Minha mãe mesma enfaixou tudo, ameaçando-me castigar e colocando pó de café para estancar o sangue. Fiquei mancando muito tempo! Posteriormente soube que o pó de café poderia causar tétano, mas era o que se fazia à época.

Havia um grande abacateiro na casa do vizinho ao lado. A casa era propriedade de americanos evangélicos e o mistério de seu isolamento nos atiçava a curiosidade. O abacateiro vivia carregado e ninguém parecia fazer uso dos abacates. Meu irmão Marco e primo Luiz Roberto eram os mentores das armações. Assim, resolvemos cavar um túnel sob o muro e pegar os abacates do outro lado. Conseguimos fazê-lo com sucesso. Durante o processo de escavação que durou dias, o buraco era tapado com uma tábua com terra e mato por cima, ao final de cada jornada, para que não vissem o que estávamos fazendo. Assim, que o túnel ficou pronto, meu irmão Marco arranjou um saco de linhagem que deveria voltar cheio de abacates. Aí, apareceu uma dificuldade. Precisávamos de luz interna. Imaginamos que a solução seria a aquisição de uma lamparina. Como adquiri-la? Foi fácil, vendemos umas torneiras de meu pai no ferro velho próximo e conseguimos o dinheiro com o qual a lamparina foi comprada. Deu tudo certo, mas o vizinho americano percebeu e nos delatou a meu pai que acabou com a nossa aventura.

Regina Lúcia, 1949.
Brincávamos com finca, bolinha de gude, bilboquê, pião. Mais tarde aprendemos a jogar barrabol e queimada na escola. Nossos pais iam ao centro à noite e ficávamos com as empregadas. Elas queriam sossego e costumavam bater na janela de fora, amedrontando os menores, como se fossem bichos ou seres do outro mundo.
Nós adorávamos brincar de construir barracas dentro de casa. Usávamos toda a roupa de cama limpa, guardada no armário embutido no quarto do Marco. Quando estava próximo de eles voltarem, a gente ia dormir... Um dia, além de fazer as barracas, brincamos de pique dentro de casa e acabamos quebrando uma cristaleira com tudo que estava dentro. Nunca vou esquecer a quantidade de cacos de vidro, de cristal e de espelho! Claro que, então, fomos dormir rapidinho!

Regina no velocípede, em 1950.
O mercado central era no local onde hoje funciona o Pathernon Center. Eu sempre fui louca por parques e bugigangas. A um quarteirão de casa, do outro lado da rua, havia as barraquinhas que vendiam essas coisas. Nós não podíamos sair sozinhos, claro, mas saímos escondidas. Eu devia ter no máximo seis anos e ainda levei a Clélia comigo para comprar bonequinhas lá.

Acontece que quase fomos atropeladas e fui devidamente repreendida por isto. Mais tarde, eu soube que ela ficou traumatizada com isso por bastante tempo. Não me lembro do que me disseram na ocasião, mas o fato é que fiquei com remorso e à noite sonhei que a Sônia, que começava a andar, era atropelada. No sonho, eu via o vestidinho que ela usava na tragédia. Para evitar a concretização do sonho, escondi o tal vestido que nunca mais foi encontrado! E fiquei tranqüila.

sábado, 16 de outubro de 2010

MEMÓRIAS DO MARANHÃO


A Estrangeira e o Tocantins
Às vezes ficava pensando nos fatos presenciados no Norte... A travessia do Tocantins, o barco de madeira, a voadeira, ocaso diário. O calor. As ladeiras beira-rio no verão. As enchentes do inverno, casas engolidas até o telhado. A população ribeirinha voltava sempre a construí-las no mesmo lugar.
E dar aulas de Inglês aos meninos índios, da reserva vizinha. Padre César os incentivava tanto! Dava-lhes livros, uniformes, ia saber por que faltavam às provas... "Ôji a gente não qué i. Tava pensano i pescá". Ainda desconheciam a mentira... Mas, deviam estudar inglês – não pertence ao currículo? Tantas vezes amanhecera a notícia – alguma aluna tinha sido roubada. Quando iam casar?
Foto tirada na fazenda.
Professor. Lá, ainda tinha status. Era sempre cumprimentada com respeito. Muitos nem se sentiam à vontade, tamanha a deferência. Não vinha do sul? Estudada? Além dos padres do colégio, era a única dos docentes que cumprira graduação. Contudo, todos eram bons, responsáveis, dedicados; sonhavam, um dia, quem sabe, cursar uma faculdade. Ali não havia. Os que tinham saído não costumavam voltar. Iam, estudavam, talvez se casassem, ficavam por lá.
Otávio e filho caçula da Aparecida e do Jamil, 1980.
Quando já se viajou muito, viveu-se noutro país, as mudanças tornam-se fatos que provocam pouca ansiedade. Aprende-se a observar sem que as coisas nos surpreendam muito. Entanto, no interior, não há de se ficar alheio. Exigem seu participar. Quando morara em São Paulo, na faculdade, as colegas diziam-na do norte. Morando ali, no sul do Maranhão, todos a consideravam diferente. Esses mineiros, essa gente do sul, são todos iguais. E seu Goiás? Sentia-se híbrida, mais nada.
Fábia junto ao Grupo onde estudava, 1980.
Calor tornou-se associado ao vazio. Falta da comunicação habitual. Falava sobre a lida, o dia-a-dia daquele povo, o que podiam entender. Aos poucos, sentiu a diferença entre comunicação e expressão. Já não tentava expressar-se, armazenava. Angústia e calor. O diz-que-diz do lugar não podia tocá-la. Se a comunicação acelerava, tinha seus parâmetros sempre mais reduzidos.
Um dia assistiu a um parto em meio ao Tocantins. A mulher vinha do sertão com uma comadre, bem cedinho. Nada, as dores amiudavam. Não trazia nada. No SESP, do outro lado, ia ser atendida. Nada pagaria e ainda vestiriam o bebê. Não deu para chegar. O nenê veio à luz no próprio barco. A outra o enrolou na própria saia. O menino-barqueiro resolveu voltar à margem. Xingava, olhando o piseiro. A mulher descendo do barco com o aspecto de uma crucificada, suando silêncio, a comadre a subir a ladeira com a criança, embrulhada na saia, suplicando ao motorista de táxi as levassem até o entroncamento... Ninguém ficara espantado – o menino seria chamado José (nome de enchente) do Tocantins Nascimento (sobrenome).
Doutra feita fora ao grupo Escola, freqüentado pelos filhos. Eles reclamavam sede. Nenhuma água havia. Por quê? Briga do Estado com o município, professora. Se a gente dispensasse os alunos por falta d’água, aqui não haveria aula há mais de seis anos.
Em pequena tinha verdadeiro pavor d’água. Aprendera a nadar (mal), depois dos vinte anos. Nas aulas levara oito sessões para ter coragem de boiar; mesmo depois de aprender, poucas vezes ousou saltar n’água. Mas naquele dia quase o fizera. De repente, poucas pessoas no barco, viram a cobra. Sentia-se presa, estátua.
Otávio, Fábia, Elisa, Cristiane e irmão caçula, 1980.
Tempo psicológico infinito. Deixar-se ficar ou saltar. Durou muito, não se decidia. Alguém matou o bicho, quebrando parte do barco de tábua. Sua compreensão demorou a decodificar o desfecho. Fora muito pior que a vez em que o motor pegara fogo e o barco deslizara à deriva. Esperavam que alguém os visse das margens e lhes viessem no encalço. O barco descia a correnteza. Podia bater em algo, virar... Mas foi visto e salvo.
Porto Franco. A cidade do já era. O povo dizia que essa havia possuído telefone, asfalto, gente jovem... Tudo se fora. Os jovens ainda vinham nas férias. A preferência era o mês de julho. Havia praia. A praia da Santa descobria-se no meio do rio, acenando duplamente aos pedaços de Goiás e Maranhão, no bico do papagaio. Hoje o pedaço do bico é do Tocantins, simplesmente...
Crianças na casa onde moramos em Porto Franco, MA.

Aborto. As discussões sobre o tema, em ambiente universitário, citadino, nada têm a ver com as impressões que colhera ali. De repente descobria que nunca fizera uma leitura de muitos fatos que se ignoram no dia-a-dia. O corre-corre da vida na cidade grande não nos dá opção. Dona Carmelina fora chamá-la para fazer uma visita. A mulher estava doente. Não forneceu detalhes. Todos, certamente, já estavam ao corrente. Na casa próxima, a mulher a esvair-se em sangue. Abortara dependurando uma espécie de ferradura, apensa ao útero. Nunca vira tanto sangue. A prima preparava remédios caseiros. Ela estava muito fraca. Escondera, a princípio, e ensopara toda a roupa duma cômoda. Na volta, Dona Carmelina explicava. Tão bonita a mulher! Não dava sorte com os homens! O marido saíra um dia para comprar sabão, há anos, nunca votara. Ficou sozinha com duas crianças. Depois apareceu o segundo. Todos incentivavam a união. Ele também abandonara a esposa ao encontrá-la com o outro. Os filhos já estavam grandes, estudando fora. Estiveram juntos por algum tempo. Teve uma menina. Depois ele voltou para a antiga mulher. Agora mantinha aquela relação com o dono da loja de tecidos, que era casado, cheio de filhos.
O povo ali era bom. Todos ajudavam uns aos outros. Estavam sempre informados de tudo, mesmo sem a existência de jornal. A TV de vez em quando funcionava. Quando a torre avariava, às vezes, passavam-se meses até que voltasse a funcionar. Não havia luz elétrica durante todo o dia. Chegava à nove, desligavam o motor ao meio dia. Ligavam-na à tardinha até à meia-noite.

Fábia e Otávio, 1985.
Morara um semestre na fazenda, em pleno sertão. Fora antes de as crianças irem à escola. Distava setenta Km de Porto Franco. A casa era um rancho reformado, fechado com paredes de alvenaria e chão cimentado. Aberto em cima, um triângulo de cada lado. Estava em meio a uma divisão do pasto, uma pequena tira de mata quase virgem à frente. Por trás, o rio Lajeado. Dizia-se que tinha jacarés. Nunca vira algum. Apenas muitas cobras, de todos os tamanhos, até uma sucuri – a sucuri nunca ofende a dona da fonte -, esperava que saíssem, ela e os meninos, hábito de todas as tardes até então. Depois cercou o pião que viera desbastar as árvores da beira da fonte. Ele alertara o patrão. Esse buscara a espingarda sob seu olhar atemorizado. Minutos mais tarde ouvira os tiros. Foram só dois, na boca do bicho de metro e meio. Tiraram-lhe a banha que servia de remédio.
Naquele dia o marido amanhecera pior. Parecia ter pegado gripe forte. Há uns dias não se alimentava bem. Agora vomitava, queixando câimbra nos membros esquerdos. Permanecera na rede, nervoso, muito fraco. Era festa do Divino, não havia morador na fazenda. Quase todos tinha ido para a reza em outra fazenda.
Tivera que tratar dos porcos, das aves. Carregara o saco às costas, todos curiosos, sempre observando-a lidar com as coisas. À noite arrumara uma mala. Se ele não melhorasse, iriam cedo para a cidade. Havia um povoado mais próximo, mas tampouco possuía hospital. Em Porto Franco havia o médico do posto.
Quando Vicente voltara à noitinha, aliviando a ressaca da pinga com algum excesso de alegria, pedira-lhe que bem cedo preparasse os animais. Teriam que ir à cidade. O patrão piorava. Já não andava. Braço e perna esquerdos estavam dormentes, meio paralisados.
Os animais ficavam soltos a cerca de duas léguas no varjão. Vicente fora cedo, mas não os encontrara. Restava pedir ao vizinho, do outro lado do rio, que emprestasse os animais.
Botou a bagagem e o menino em um deles. Montara o outro burro com a menina. Álvaro fora colocado sobre o terceiro, Vicente a pé, puxando o animal. Cinco léguas até o Paraíso. Tão devagar, a viagem aflita.Seria derrame? Daria tempo. Horas depois, além da metade do caminho, o rancho do Alcides Branco. Vicente tomou o melhor animal e foi sozinho à Vila, para fretar um carro. O restante da estrada não era transitável, muito barro, tocos de picada. E os mutucas de ferrão. Dali à frente, o areião. Tombador. Voltou logo, esperto, prestativo nas necessidades.
Gustavo, Otávio e Fábia, 1986.
Não tinham dinheiro. O aluguel da casa em Goiânia seria enviado no fim do mês. O outro Vicente, o do armazém, mais tarde vereador, emprestou-lhes todo o dinheiro de que dispunha.

Chegaram à noite a Porto Franco. Os meninos ficaram na casa do seu Sé. Dª. Carmelina viajara. Prepara-lhes um lanche e levou-o ao médico. Não havia luz. O médico não pôde examiná-lo. Passara-lhe alguns medicamentos, pedindo que voltasse de manhã. Nada encontrou nas farmácias. Um era injeção. Teriam que se apressar, descer a ladeira e pegar o barco para Tocantinópolis. Poderiam ligar do centro telefônico de lá e, quem sabe, encontrar o necessário.
Do outro lado tomaram um táxi. Pediu ao motorista que ajudasse o marido nas farmácias. Depois, deixá-lo-ia na beira do rio, enquanto ela ia telefonar. Havia muita gente. Esperou cerca de duas horas. Ligou para a irmã, pedindo que lhe adiantasse o dinheiro, pelo banco local, na manhã seguinte. Se Álvaro não melhorasse, só andava apoiado, a perna já nem mexia, poderia interná-lo?
Custou-lhe distingui-lo à beira do rio. Tão escuro. O barco no Tocantins. Voltaram. Seu Sé foi franco. Hábito cultural da região. Não se enganava, não. Vira o irmão de Carmelita morrer de derrame. Fora mais rápido, mas os sintomas eram idênticos. Se preparasse para o pior. No dia seguinte não voltou ao médico dali. Nem tudo que ele receitara foi encontrado. Não havia luz, nem hospital. Melhor Tocantinópolis.
Seu Sé emprestou a camionete para atravessarem na balsa. Álvaro, agora, só carregado. Valter dirigiu, levou-o ao hospital, onde ficou internado. O outro médico pensava em falta de circulação nas extremidades. Este diagnosticara um derrame. O doente ficou na enfermaria enquanto, com Valter, ia revalidar a carteirinha do INSS. No interior a burocracia é menor, apesar da falta de conforto.
Voltou para Porto Franco para fazer almoço. Os homens com a viagem da dona da casa comiam fora. Naquele dia, todos (meia dúzia?) almoçaram lá.
Depois do almoço pegou o barco para Tocantinópolis. Foi ao banco. O dinheiro chegara, ainda bem. Poderia acertar o frete até à cidade. Comprar mistura para as refeições. Voltou a ligar da telefônica. Falara pouco à véspera. Todos preocupados, não tinham como comunicarem. Álvaro já estava internado. Suspeita de derrame. Continuava na mesma. Os meninos ficaram com uma vizinha de D. Carmelita. Ela se oferecera e aceitara na hora. Era a mulher do aborto, mas então, ainda não se tinham visto.
Por cinco dias repetira a visita à enfermaria nos dois turnos. No terceiro dia, Álvaro contou que por pouco morrera. Sentira lhe gelar uma das pernas, o médico, chamado às pressas, aplicara-lhe uma injeção. Começava a querer mexer o pé e os dedos da mão. Conversou com o médico. A família em Goiânia aventara a possibilidade de mandar buscá-lo. O médico não o permitiu. Se não houvesse alterações, teria alta logo. Porém, levaria meses até que voltasse a andar normalmente. Teria que continuar com os medicamentos para evitar recaída fatal.

Renata, Regina, Fábia, Tarsila e Leandro, 1986.
Dª Carmelina chegaria à noite daquele dia. Seu Sé entregara-lhe duas galinhas mortas que pedira a uma vizinha que matasse para preparar-lhe ao molho pardo. Nunca preparara uma galinha. Informou-se sobre o molho e quase vomitou. Desde pequena tinha nojo de frango. Imagine preparando dois - molho de sangue como gema de ovo?
Foi rápido ao hospital. Teria muito trabalho naquele dia. Álvaro estava bem melhor, até satisfeito. O pior foi a permanência no hospital. A uma quadra de distância sentira um mau cheiro horrível. Coisa podre. Operaram uma mulher do sertão que trazia uns tumores putrefatos. O odor impregnara-lhe as narinas. Vomitara antes de entrar no hospital que estava sendo todo lavado, chão, paredes, mobiliário. Saiu logo, como vomitava fácil! Infelizmente o cheiro não ficara lá – trazia-o no nariz. Por dois dias ficou quase sem comer. Tomava café, pão de queijo seco.
Foi terrível preparar o jantar. Mas deu certo. Até os frangos ou galinhas ao molho pardo. Preparara pizzas também que agradaram a todos. E como sempre aparecia tanta gente às refeições, preocupada, exagerara a quantidade do arroz. Sobrou para o dia seguinte. Dª Carmelina – tão doce e forte, mãe. Regina, você joga com minhas cartas, a sua vida. Contava passagens do nascimento dos dez filhos, o marido sempre ausente, enfrentando tudo sozinha... Repetiu-lhe o provérbio – “Deus escreve certo em linhas tortas” – agora, Álvaro vai ter que vender essas terras, voltaremos a Goiânia. Os meninos irão para uma boa escola...
Este era o plano que discutimos quando Álvaro voltou do hospital. Era meado de maio. Época da colheita do arroz. Deixara-o lá plantado. Era necessário primeiro voltar à fazenda, terminar a colheita. Em julho voltaríamos. Teríamos vendido também o trator, o gado e a pequena máquina de beneficiar arroz.
Voltamos e quinze dias depois ele andava quilômetros e quilômetros, trabalhando na colheita. No final de junho retornamos a Porto Franco. Álvaro já vendera o trator, mas ainda não o recebera. Havíamos comprado as passagens – vinte e quatro horas de ônibus – pela Belém-Brasília. Quando esse não quebrava. Doutra feita nos atrasamos dez horas.
Resolvemos que eu viria na frente. Traria Izinha, filha de vizinhos da fazenda. Ela queria estudar e poderia ajudar-me com as crianças. Minha irmã ia casar-se em julho – seríamos testemunhas.
Fiquei hospedada em casa de outra irmã. Nossa casa estava alugada. Mas mamãe arranjava-nos um barracão, onde morávamos antes, que estaria desocupado em breve.
Álvaro voltou só no dia do casamento. Quando conversamos, mais tarde, contando-lhe que havia matriculado as crianças em um bom colégio e assumira a coordenação geral de uma escola da rede pública, pedindo retorno ao cargo anterior, ele, então, disse-me que recebera o dinheiro do trator e comprara mais cem alqueires de terra. Pretendia desenrolar o processo demarcatório da terra para posterior financiamento.
Em meio à minha enorme decepção, mágoa, desespero, (in)compreensão resignada, ele afirmou que “poderíamos permanecer” ali em Goiânia. Teria mais liberdade para agilizar alguma produção na fazenda. Ficamos. Jurei que nunca mais moraria naquela fazenda.
Álvaro, Fábia e Otávio, em 1986.
Em novembro ele voltou para buscar-nos. Falou das vantagens de morarmos em Tocantinópolis ou Porto Franco. Eu poderia afastar-me por algum tempo da direção do curso de Inglês que possuía com duas sócias e pedir minha remoção para Tocantinópolis. O contrato valia em todo o Estado.
Mudamos em dezembro e comecei a juntar as experiências diárias da travessia do Tocantins, a princípio, pela manhã e à noite, Depois fiquei apenas de manhã. A vida não é uma escola? Prometi que ficaria por dois anos. Então voltaríamos.
Voltei com as crianças na época combinada. Álvaro nunca entendeu por quê. Concordou. Depois, revoltou-se. Vinha a cada três ou quatro meses, chegando sempre com a esperança de levar-nos. Quando vim sabia que jamais voltaria lá. Ele não. Quebrou a cabeça por mais alguns anos até que desistiu. Foi duro assumir sozinha a responsabilidade educacional de duas crianças – criadas apenas com os proventos do magistério goiano. Mas nunca me arrependi.
Lembra-me de seu susto, quando, ao retornar da fazenda, soube que eu vendera tudo, para virmos embora. Era o que tínhamos(?)combinado. Acordo unilateral. Ele nunca escutava o que não lhe interessava. Com o tempo mudou muito pouco.

Texto escrito por REGINA LUCIA DE ARAÚJO, baseado em sua própria experiência de vida em Porto Franco, MA., até 1981, quando retornou a Goiânia.