terça-feira, 22 de outubro de 2013

ALEIXO E A NOITE DAS MENTIRAS



Aleixo Nuss Oliveira, 1968
Na venda do Tio Alfredo acontecia uma espécie de disputa. O pessoal se reunia e cada um contava a sua mentira. Eram histórias incríveis, mas Aleixo não participava porque ainda era criança. Ele nunca foi um tipo muito sociável, mas era muito curioso, atento e observador. Os detalhes, até onde suas leituras de mundo podiam ir, eram bem gravados. Os adultos sempre foram seus melhores amigos, salvas as exceções, claro. Aquele que pegava no seu pé, fosse quem fosse, não era seu amigo ou sua amiga. Ele era um perguntador de marca maior, queria detalhes, mas nem sempre acreditava nas respostas, já que os adultos, às vezes, não davam o braço a torcer dizendo “não sei”... 
Aleixo, 1978.
Eles preferiam inventar respostas e corriam o risco de cair no seu descrédito. Diz que seu pai e sua mãe sempre caíam.

Quando ele viu, pela primeira vez, uma Maria-fumaça (locomotiva à lenha), ele ficou maravilhado. Perguntou a seu pai como “aquilo” funcionava. Seu Sílvio pensou um pouco e disse: "lá tem uma caldeira que gera vapor com o fogo que ferve a água e empurra as engrenagens que fazem as rodas moverem". Aleixo pensou no fogo, na chaleira d’água fervendo, jogando a tampa para cima, aceitou!
Aleixo Nuss, 2003.
Mas outra vez, dentre muitas, pegou seu pai no pulo: queria saber como as lâmpadas elétricas acendiam. Obteve como resposta que “dentro do fio tem querosene para acender a lâmpada”, coisa que gerou um sem fim de indagações e dúvidas, obrigando seu pai a dizer que a lâmpada era acesa por meio de eletricidade e que ele não sabia muito bem como ela acendia. Calou-se, então, claro. Saberia como a luz acendia quando fosse um pouco mais velho... Além do mais, seu pai havia ganhado o concurso de mentiras que promoviam lá na venda de seu tio, como aquela da onça gigante que ele tinha segurado pelo rabo, rodado no ar e jogado longe, dentre muitas outras histórias contadas nas noites das mentiras...

Aleixo e Regina, em Alto Paraíso, 2012
Um dia, na primeira e excitadíssima viagem de Maria fumaça, perguntou ao condutor barrigudo, de nariz de bolota e vermelho, se ele sabia falar na moega do telefone para se comunicar com outras estações. Seu pai piscou o olho para o condutor e ele disse que sim. 
Numa dessas rodadas de mentiras, um senhor, também contador de mentiras bem elaboradas, apareceu com a história de um repolho gigante que o próprio havia colhido em sua horta. O repolho era tão grande, mas tão grande, mas tão grande, que foi preciso de um carro de bois para transportá-lo e, mesmo assim, com muita dificuldade, pois as seis juntas de bois suaram para arrastar o carro até à Rua(povoado de São João do Paraíso), no interior do Estado do Rio de Janeiro. Daí, tudo bem, todos acreditaram...
Aleixo com labradores no sítio.
Lá pelas tantas, depois de muito café, broa de milho e um pouco de uca, já nas últimas mentiras, todos tinham que acordar cedo para os afazeres, que nunca eram poucos, seu pai, com aquele sorrisinho moleque, começou com uma história de uma panela que ele havia mandado fazer, especialmente, lá na forja do seu... Sei lá como se chama... Todos se entreolharam, silêncio... Mas o espertinho do homem do repolho não aguentou: mas pra quê, esse panelão tão grandão, seu Sirvo? "Ô meu filho, como é que vão cozinhar seu repolho"? 
Silvio Ribeiro de Oliveira
A gargalhada foi geral, todos se despediram, prometendo nova rodada para breve, mas dessa vez Seu Sílvio ficaria de fora, iria cantar e tocar violão em uma festa. Lá haveria dança, muita comida e bebidas para todos. 
Hoje, Lu, irmã do Aleixo, me enviou uma foto de seu pai, o senhor Sílvio. Ele está sobre uma árvore que eu tive oportunidade de ver quando visitei a região da Capivara em que residia a família Nuss. Lourdes me confidenciou que ajudou a plantar essa árvore em comemoração escolar! Ela fica perto da antiga escola...

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