Clélia e Regina, 25.11.1996. Em lançamento do livro Presente de Meiga. |
Eu fui alfabetizada antes mesmo de ir à escola, porque minha mãe acompanhava os deveres escolares de meu irmão Marco e me passava tarefas, paralelamente, para me manter ocupada. Também me mandava com ele para as suas aulas particulares e, quando me dei conta, sabia ler. Aos seis anos fui matriculada no Colégio Santo Agostinho e aconselhada a não deixar a freira perceber o meu nível de alfabetização. Minha irmã Clélia também aprendeu a ler assim que completou a idade para frequentar a escola e fomos presenteadas com duas coleções completas: Monteiro Lobato e História das Religiões.
Assim, após o jantar, papai se deitava e nos levava com ele para que lêssemos em voz alta para sua audição. O primeiro livro escolhido foi: As Reinações de Narizinho. Nós vibrávamos com as histórias de Lobato e viajávamos imaginando ter tomado o pó de pirlimpimpim, admirando a cultura do Visconde de Sabugosa, as traquinagens das crianças, o mundo mágico que íamos desvelando.
Regina pesquisando para tese sobre Raul Pompéia. Rio, 2004. |
Com a ida de nosso irmão Marco para o internato, em Belo Horizonte, passamos a ocupar a sala de visitas transformada em quarto para nós duas. Assim, furtávamos os livros da estante de vidro martelado de nosso pai e líamos à noite, apenas com a pouca luz que vinha do vitreaux do alpendre de nossa casa. Tudo isso foi muito importante para que cultivássemos para sempre o hábito da leitura!
Prédio do antigo Ateneu, de Raul Pompéia. |
Após a morte de nosso pai, um dia, ao voltarmos das atividades escolares, encontramos uma fogueira no quintal. Minha mãe havia resolvido queimar alguns pertences de papai que não tinham sido doados e, entre eles, todos os seus livros!
A gente não podia mais fazer nada e permanecemos mudas, sem entender a complexidade das reações humanas! Acho que ela nunca compreendeu o que aquilo significava para nós...
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