Didi, Gomes, Regina, Wilna, 25.11.1996. |
DOAÇÃO
Doa-se um coração
cheio de amor
cheio de amor
que não passa.
Ele vai de graça
e sem trapaça,
mas exige
sensibilidade.
Quem o receber
terá que reconhecer
sua complexa composição.
Doa-se um coração
Do-ente de amor.
Quem o aceitar,
também terá
muito amor a doar.
Não pode ser qualquer amor
Tem de ser
Daquele amor
que respira
saudade
do-eu.
Doa-se um coração
Com tradições celtas,
Não será qualquer um
A recebê-lo
Almeja-se
À sabedoria
Druídica.
Doa-se um coração
Iluminado de ternura
Ele traz aquele amor
De rainha capturada,
Tem sangue cigano,
Segredos de sacerdotisa,
Pureza da criança milenar.
Doa-se um coração singular
Sensível à realeza
E à verdade
Ao conhecimento
E à compreensão,
Sobretudo
Que produz amor.
Doa-se um coração
Capaz da compaixão
Que sofre-espera
A bênção sagrada
Dos arcanjos
De sua contemplação.
Ilustração do poema feita por José Antônio GOMES de Sousa. |
Tentava imaginar o presente.
Não contava com este tempo
No passado,
O que presentear?
Embora o tempo presente
Estranho,
A vontade permanece?
Pensou oferecer-lhe
Aquela lua azul lá fora
Ao som colorido
E perfumado do sino
Com gosto
Dos brincos de princesa
Que tem até anjos
Para atender
Qualquer um des seus sonhos.
Se pudesse ser
Presente em cada um
E encantá-lo
Mais e sempre,
Ser seu presente
Em todo tempo
Presente presente,
passado,
futuro
sempre.
Acordou...
Três caixas de bombons,
Uma para cada tempo
Que não pôde ser aceite.
ARAUJO, Regina Lúcia de. In: Presente de Meiga. Ed. PUC-Goiás, 1996.
O presente sobre a mesa. De Meiga. Não conhecia ninguém com esse nome: amável, caroável, bondosa, bruxinha boa. Na certa, armadilha. Supus. Deixei ali. Minutos depois, olha eu, de novo, às voltas de novo com o embrulho. Chocolate, bombons, uma jóia? "tentava imaginar o presente/ Não contava com esse tempo/ No passado". Abri. A primeira capa. História de náufrago, de muitas eras. Um livro. Desfolhei. Propunha-me a me ensinar a navegar. Eu, um marinheiro sem viagem.
Entrei na caixa. Fiz-me ao mar. Viajei. magicamente vi a vida interna de Meiga: ela me contava.Vinha de longe, do escuro do mundo, a explosão. A morte morreu, sobreviveram, ela e a vida. Começou a luta: solidão no encontro, queda no voo, sonho na dor, identidade nos fragmentos. Dos escombros, sacudiu a poeira. Chegou ao presente.
Sofreu de desejo -"do completar-se, da expectativa do niilismo, da trombada de sonhos, do mar intransitivo, do caos interno, da busca vã, do voto perdido, do silêncio do próximo, do vencer o nada, da individualidade doída, chegou ao trânsito. Buzinas. Despertou-se. Buscou saída.
Foi à janela. Grade. Chovia. Viu a chuva. " Sussurrantemente compassada/ O cenário." Pensou na flor, esperou a rosa. Amor- Perfeito. Imaginou. A pátria de poetas. Poemas. Constituição de versos. Olhou. Além das aparências, a vida. Até controlou uma "canção noturna". Mas veio o tédio. Tristeza lânguida do embalo. O vazio.
Ainda chovia na vidraça transperente. Cerrou os punhos. Pegou pedras invisíveis: fez estadas no pântano. Tomou dos sonhos: pôs na mala. despiu-se das fantasias: " tornou-se avessa ( inperfeição)". Inventou palavras "do - ente": explicou a dor. Até cansar. Pr, ostar-se. Amou. Fez presente. Dos escombros, bombons; do vazio, papel; da dor, o nó; doou-se. Enviou-se a nós. Leitores. No centro, o coração. Vida em flor. Perfumados versos. Seu primeiro livro.
Apresentação do livro Presente de Meiga, feita pelo colega escritor: Lacordaire Vieira
É sempre um prazer ouvir seus poemas, porque embora sejam escritos, eles tem uma enorme musicalidade.
ResponderExcluirTambém gosto bastante de alguns deles! E acabei de pensar que minha vida é um blog aberto,aliás dois, neste enquanto! Isto será uma epígrafe de próxima postagem...Hehehe
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